quarta-feira, 23 de março de 2011

"Para ouvir uma canção: 'A canção polifônica' "

Os comentários de hoje são na clave de Santuza Cambraia Naves. Seu diapasão afinou a conferência no tom da polifonia. Ela partiu de Bakhtin, para o qual o romance de Dostoiévski inaugura a presença de vozes múltiplas. Santuza apontou como seu pensamento pode auxiliar a pensar a estrutura múltipla de vozes das canções que vão desde "Pelo Telefone" de Donga (1916), "Conversa de Botequim" de Noel Rosa (1935),"História de Pescadores" de Dorival Caymmi(1965),"O Rei do Gatilho" interpretada por Moreira da Silva (1962), "Carnaval do Geraldo" do Grupo Rumo (1981) até "Você não soube me amar" da Blitz. Com essas canções, Naves percorreu a transfiguração de características épicas e sentimentais para um processo de estruturação mais fragmentado da música popular coincidente com o momento de abertura política no país. Da mesma maneira que concordava com o recorte do canceioneiro popular proposto por Naves, me perguntava, mesmo correndo o risco de tocar em um lugar "fetichizado", qual o motivo dela não ter mencionado a Tropicália como ação iniciática dessa possibilidade entrecortada que identificara na canção dos anos 80... Ao mesmo tempo que eu puxava em minhas memórias conexões com vozes e memórias também outras por mim experienciadas, me instigava pelas memórias que as canções abordadas por Naves suscitavam no público presente ao escutá-las. As canções provoacam relações ou elas eram possibilitadas por que as canções existiam? Longe de respostas exatas, parecia imprescindível, enquanto Santuza lia e exemplificava seu texto com a escuta dessas canções, que eu me atentasse à platéia. Eu não segurava minha ansiedade para chegar o momento das perguntas. Afinal, nelas poderia identificar traços da recepção como o lugar da exisência do múltiplo e de vozes diversas. A sensatez da leitura de Santuza suscitava o desejo de ler seu texto - "A canção polifônica" - para além das vozes por ela apontadas como sendo trocas de turno de enunciação ou pessoas do discurso nas análises musicais que propôs. Instigava-me a ideia de pensar essas vozes como pontos de contato que as canções apresentavam, da temática ao ritmo, tecendo uma textura que intercambiava-se com a melodia e a harmonia enquanto traços distintivos, onde o público presente também paracia fazer-se voz e espaço substancialmente polifônico nelas - muito embora essa profusão de vozes não estivesse acontecendo concomitantemente, mas de modo suplementar. Chegado o momento das perguntas, a escrita falada de Santuza parecia ter mediado um estado de percepção musical na platéia que se via sedenta pelo diálogo com a pesquisadora. E foi na tensão entre o texto de Santuza e a platéia que pude me apropriar das colocações abaixo enquanto desencadeadoras de provocações críticas fragmentadas:
* " Samba é aquilo que a gente reconhece como samba "?
* Como pensar em memória da canção na medida em que um dos ouvintes se manifestou como diretor da " Museu da Imagem e do som do Rio de Janeiro "?
* Cabe ao arranjo ser só é maravilhoso, como evidenciara Santuza em alguma das respostas?
* É pertinente pensar em " evolução na canção"?
* Em uma das respostas Santuza disse que " as coisas não existem em si ". Em que medida as canções são construidas e formadoras?
* " A música é a psicanálise mais barata.Sucídio da cultura nacional e tome Big Brother". E ela teria que se prestar a isso?
* Para conhecer, sugestões vindas platéia: " Pensando em Ti " (Herivelto Martins & David Nasser) ; Haroldo Costa.
Vamos conversando que se o trânsito Gávea - Largo da Carioca ajudar a chegar em tempo na Caixa Cultural, amanhã tem mais comentário da conferência de Gaspar Paz, " Interpretação e canção popular".

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